Memória de Trabalho Fonológica em Pessoas com Autismo: o que a pesquisa revela
A memória de trabalho fonológica é o sistema responsável por reter e manipular informações relacionadas à fala e aos sons por um curto período de tempo. Ela é essencial para o desenvolvimento da linguagem, da leitura, da comunicação e da aprendizagem. Em pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA), essa habilidade tem sido amplamente estudada, mas os resultados das pesquisas nem sempre foram consistentes — alguns estudos encontraram déficits, enquanto outros não observaram diferenças em relação a pessoas sem autismo.
Para esclarecer essa questão, Habib e colaboradores (2019) realizaram uma meta-análise, reunindo e analisando os resultados de diversos estudos científicos que compararam o desempenho de pessoas com TEA e indivíduos neurotípicos em tarefas de memória fonológica. Essa abordagem permite observar o panorama geral das evidências, aumentando a confiabilidade das conclusões.
Ao todo, foram selecionados nove estudos que avaliaram a precisão (ou acerto) em tarefas de memória fonológica e dois estudos que analisaram taxas de erro. Os participantes incluídos tinham idade média entre 11 e 31 anos e quociente de inteligência (QI) dentro da faixa típica (acima de 70), o que garantiu que as diferenças observadas estivessem relacionadas ao funcionamento da memória, e não a outros fatores cognitivos.
Os resultados mostraram que as pessoas com TEA apresentaram desempenho significativamente inferior nas tarefas que exigiam reter e repetir informações verbais. Em média, o grupo com autismo teve pontuações menores de precisão, indicando uma dificuldade moderada a grande em comparação com os participantes neurotípicos. Já nas tarefas que mediam erros cometidos, os resultados também sugeriram uma tendência de pior desempenho, embora com maior variação entre os estudos.
Esses achados indicam que o processamento fonológico e a manutenção de informações verbais na memória de curto prazo podem ser áreas de vulnerabilidade cognitiva em pessoas com TEA. Essa dificuldade pode afetar diretamente o desenvolvimento da linguagem, a compreensão verbal, o aprendizado de novos conteúdos e até a comunicação social — domínios frequentemente desafiadores para esse grupo.
Além disso, os pesquisadores verificaram que idade e QI não explicavam as diferenças observadas, ou seja, a dificuldade na memória fonológica parece estar presente ao longo de toda a vida, independentemente do nível de inteligência. Isso reforça a importância de desenvolver estratégias de memorização que fortaleçam a memória verbal, utilizando recursos visuais e repetições estruturadas para facilitar a compreensão e o aprendizado.Em resumo, a meta-análise de Habib et al. (2019) confirma que a memória de trabalho fonológica é uma das funções cognitivas mais afetadas no autismo. Compreender essas limitações é o primeiro passo para promover intervenções, valorizando a neurodiversidade e adequando o ensino às formas únicas de processamento de cada indivíduo.
Referência (ABNT):
HABIB, Abdullah; HARRIS, Leanne; POLLICK, Frank; MELVILLE, Craig. A meta-analysis of working memory in individuals with autism spectrum disorders. PLOS ONE, v. 14, n. 4, e0216198, 2019.